Uma lua de inverno

Uma lua de inverno

terça-feira, julho 14, 2009

Aos que se vão


Morrer faz parte da vida. Uma verdade inconstestável sempre presente na boca da minha saudosa e sábia mãe. Os pais vão embora, outros parentes e os amigos também. Entre outras
mazelas de envelhecer uma delas talvez seja a pior de todas, ver partir as pessoas que amamos e admiramos. Mas, por vezes, a perplexidade me toma quando me dou conta de que alguns humanos - feitos de barros especiais e únicos em sua missão - deixam muito mais que a saudade da presença física. Algo de maior se foi também. As especificidades que fazem dessas pessoas únicas. E, assim, na minha história a caminho da velhice já se somam muitas e irreparáveis perdas.
Em pouco mais de um mês lá se foram dois amigos queridos. Walter Bandeira deixou além da maneira única de dizer que me amava e se preocupava comigo - principalmente depois de além-mar-, as lições de que ser gente é acima de tudo dar de cara com o lado mais difícil que todo mundo tem. Ao cantar "Joana Francesa" toda vez que eu estava presente, ele dizia à minha mente tão cansada"acorda, acorda, acorda... vem molhar meu colo, vou te consolar".
O Juca, um dos mais inteligentes e generosos intelectuais que tive o prazer de conviver em Belém, me deixou como grande lição de vida o respeito às diferenças. Nossa admiração era mútua e, certamente, o bom jornalismo que ele fazia deixará um vazio enorme, pois com a quase total pobreza de nossa grande imprensa, ele lembrava sempre que o papel do quarto poder é atuar para e pelo interesse público.
Muita saudade, mais umas ao rol que carrego no peito.
A vida é assim, custo a crer, mas é. Um dia também completarei meu tempo. Cedo ou tarde. Minha crença diz que só Deus saberá. Enquanto isso, acumulo essas ausências e tento transformá-las numa maneira de manter somente as melhores lembranças - que é pra ver se posso tentar dar um travão na tristeza que me consome.
Ao Walter, ao Juca....meu afecto para sempre.

p.s: O casarão da foto (na 3a. rua de Icoaraci), assim como as pessoas, também encontra seu fim. Hoje restam ruínas que não me apetece evocar. Prefiro essa imagem, que é da minha infãncia, quando eu achava que ali moravam as pessoas mais ricas e felizes daquela Vila de Pinheiros.

quinta-feira, maio 28, 2009

Liz Fraser

Nunca vou me cansar de ouvi-la.
http://www.youtube.com/watch?v=URvC-7lcrvI

As ruínas dos nossos dias


Casas velhas e aos pedaços sempre despertaram minha imaginação. Quanto mais em ruínas, mais motivados os pensamentos. Creio que as casas são como as pessoas, guardam histórias - de dores, de  amores, de alegrias - assim como nós. Talvez a diferença esteja no facto de que sobre as histórias que registramos podemos nós mesmos contar. Às casas não é delegado poderes de fala tão simplesmente porque quando deixadas ao sabor do tempo, restam as paredes mal caiadas e as coberturas a desabar. Se há quem sobreviva a elas, contam-se suas histórias. Mas se não há, seus restos suscitam possíveis narrativas fantasiosas em grande parte. E, tal como nossos corpos, não sobrevivem ao tempo. Este sim, implacável, mas que em mim não suscita mais a imaginação, apenas o vejo passar.

quinta-feira, maio 14, 2009

Fala-me do que não sei


Compreender exige estar no lugar do outro. Estar com outro, ser com o outro, mas como se o outro é apenas, o outro? A existência de outro é dele, a ele pertence, não alcanço, não há permissão. Há o limite, o erro, o  espaço entre mim e ti...por isso, prefiro a chuva e aos gatos...claro, independentes, chegam e vão embora quando querem.

quinta-feira, março 12, 2009

O tempo de cada um


Assisti Wayne Sorter Quartet ontem, 11 de março, no Porto. Rara oportunidade, eu sei.Em umas das melhores salas da Europa, em termos de acústica.
Vi um músico de jazz, dos bons, cansado. Isso, ele pareceu cansado e o mais evidente disso era que o saxofonista que tocou com Miles Davis e fez parte do The Jazz Messengers se encostava ao piano de Danilo Perez - aliás, fantástico - sempre que podia.
Assisti a um músico que nem boa noite deu à plateia de mais de 500 pessoas. Não faz mal. Eles não tocam pra nós. Brincavam entre eles, a música que faziam era pra eles. E nós? Meros convidados a apreciar...é isso. Tudo bem. Valeu os 30 €. Aliás, vale muito mais. Alguns portugueses não entenderam bem porque aquele monstro do jazz estar, assim, tão distante. Porém, quando o sobrepeso ou soma dos anos deixavam Wayne ser o mesmo de sempre, aquele que improvisava dentro da forma, nossa!! Que virtuose!! Me senti privilegiada, afinal, ser convidada para participar desse encontro, entre eles, os pares, só me deixou com vontade de tomar um bom alentejado e dizer, entre amigos, ele tá cansado, mas ainda assim é "o cara".

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

A difícil arte de administrar a saudade


A cisma do bem querer me faz pensar que nem sempre soube ser racional ao gestar os desejos. A moldura que se enquadra no momento é a certeza de que não se pode ter o melhor dos dois mundo. Daí a eterna dificuldade em distinguir os afetos e impossibilidade de domar as saudades, sim, no plural, já que são distintas em intensidade e formato. No auge da indagação, ao que se pode chamar de consciência dos limites, me deparo com o registro do lugar que hoje chamo de casa. Um lar de onde vislumbro toda a cidade, que está aos meus pés como que a me dizer que posso estar sem medo e, que, a melancolia de agora em breve se substituirá por outra. No vai e vem do marcador temporal, a vida segue seu curso, como um rio ou uma Ria.

p.s: No 13 andar do prédio branco, à direita da foto. É de lá que meus olhos transbordam desse lugar.